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Entrevista com Maria Cristina Hoffmann, Consultora Nacional para o Envelhecimento Saudável da OPAS

Maria Cristina Hoffmann, Consultora Nacional para o Envelhecimento Saudável da OPAS- agência que trabalha com os países das Américas para melhorar a saúde e a qualidade de vida de suas populações. Foto: jornal3idade.com.br

Jornal da 3ª Idade – Qual a função da senhora no escritório da OPAS no Brasil e como seu trabalho contribui para melhorar a qualidade de vida dos brasileiros mais velhos?

Maria Cristina Hoffmann, Consultora Nacional para o Envelhecimento Saudável- OPAS/OMS, no Brasil – Sou psicóloga, formada na PUC do Rio Grande do Sul e tenho toda minha atuação na Saúde Pública, em especial na Saúde Mental. Em 1996 vim para Brasília acompanhar meu marido que não é da área governamental. Na época surgiu a oportunidade de trabalhar no Ministério da Justiça, no Departamento de Entorpecentes, que nem existe mais. Lá se atuava nas políticas para álcool e outras drogas. Depois trabalhei na criação da Secretaria Nacional Antidrogas, que era ligada à presidência da república. Em 2001 recebi um convite para trabalhar na Coordenação de Saúde Mental do Ministério da Saúde, onde se pensava na reforma psiquiátrica, na mudança dos modelos de atenção, num atendimento voltado à inclusão e na forma dos cuidados na comunidade. A Saúde Mental traz muitas contribuições para todas as demais áreas, não na inclusão, mas também na visão de mundo como um todo. Não sou servidora, sempre trabalhei por contrato. Tive uma rápida passagem pelo departamento de Ciência e Tecnologia, onde coordenei a Área de Gestão do Conhecimento, que é uma das que mais gosto. Sou pesquisadora convidada da Universidade de Brasília. Em 2012 fui convidada a assumir a Coordenação Nacional da Saúde da Pessoa Idosa, pela minha experiência em gestão de políticas públicas. Não conhecia muito da área. Na verdade era para ser um trabalho temporário, mas fiquei até a saída da presidente Dilma Rousseff. Continuei atuando como consultora até 2022 quando fiz uma seleção para a OPAS – Organização Pan-americana de Saúde, para o cargo de Consultora do Envelhecimento Saudável. 

Jornal da 3ª Idade – O que exatamente faz esse tipo de consultoria?

Maria Cristina Hoffmann, Consultora Nacional para o Envelhecimento Saudável- OPAS/OMS, no Brasil – Quando fui da Coordenação da Pessoa Idosa, do Mistério da Saúde, tinha a função de apoiar e subsidiar Estados e municípios, na implementação da Política Nacional de Saúde para a Pessoa Idosa. Era uma área que não tinha muitos recursos específicos, mas o SUS têm programas voltados para vários segmentos da população. Então o desafio é descobrir como permear as políticas e serviços para que tenha uma compreensão do que seja tratar, acompanhar e cuidar das pessoas idosas. O grande desafio é saber como atravessar as “caixinhas” das políticas e integrar de uma forma geral. Não dá para falar do envelhecimento sem abordar todos os fatores que influenciam a vida da gente: a renda, a classe social, o gênero, a cor, os acessos, o bairro que se mora, são definidos para a qualidade de vida. Por isso as políticas têm que estar tão integradas. A Saúde, Educação, Assistência Social, precisam conversar. Temos que trabalhar com o conceito ampliado de Saúde, embora nosso sistema ainda seja muito pautado na resolução das doenças.

Jornal da 3ª Idade – O SUS desde que foi criado fala da necessidade da mudança no modelo de atenção, mas não é exatamente dessa maneira que agem todos os municípios.

Maria Cristina Hoffmann, Consultora Nacional para o Envelhecimento Saudável- OPAS/OMS, no Brasil – O cuidado integral é aquele que oferece aquilo que a pessoa precisa no território. Saber como estão essas condições fazem parte das funções das equipes da Atenção Primária. Não adianta ter um super especialista atendendo se ele não tiver subsídios de como vive a pessoa que está sendo atendida. Porque as recomendações de comer nos horários adequados, de ingerir frutas e legumes, de comer carne, de nada vão adiantar se for para um público sem as condições ideais para isso. Por isso os determinantes de saúde são muito importantes.

Jornal da 3ª Idade – Considerando os territórios das Américas tão desiguais, como a OPAS acompanha as condições para o um envelhecimento saudável nos diferentes lugares?

Maria Cristina Hoffmann, Consultora Nacional para o Envelhecimento Saudável- OPAS/OMS, no Brasil – A OPAS é o braço que fala de Saúde, na região das Américas, pela Organização Mundial da Saúde, cuja sede é em Washington e o presidente é um brasileiro, o sanitarista Jarbas Barbosa. O escritório do Brasil é presidido pela Dra. Socorro Gross Galiano. A missão da OPAS é apoiar o Ministério da Saúde, as secretarias estaduais e municipais de Saúde e outras parcerias também. Temos parcerias com o Ministério da Justiça, dos Direitos Humanos e fundações. Como se organizar. Existe uma Coordenação de Saúde que acompanha vários temas e cada um deles tem uma consultoria. Atualmente acompanho a área do envelhecimento, da Saúde Mental e da Saúde do Homem. Quando um gestor municipal quer avançar numa discussão sobre políticas de cuidado de longo prazo, que é um dos motes da Década do Envelhecimento Saudável, procura a OPAS que vai, usando um pouco da experiência dos seus consultores e de outros países, identificar como poderá orientar aquela cidade ou instituição. As parcerias são estabelecidas a partir de um termo de cooperação técnica, que pode envolver recursos ou não. Pode ser fazer um evento, um documento, uma discussão ou uma cooperação maior onde a OPAS vai ser executora, identificando as ações prioritárias.

Jornal da 3ª Idade – Os trabalhos são programáticos, não existe um trabalho direto com populações.

Maria Cristina Hoffmann, Consultora Nacional para o Envelhecimento Saudável- OPAS/OMS, no Brasil – O trabalho é direto com gestores e profissionais, visando atender as demandas das populações. Em setembro fizemos a tradução para português de um Guia de Prevenção do Suicídio. A ONU definiu 2021 a 2030 como a Década do Envelhecimento Saudável para chamar a atenção dos países para os diferentes problemas. O Idadismo, o preconceito contra as pessoas idosas, que vem sendo bastante divulgado é uma dessas ações. Um dos Estados brasileiros que se destacam nesse trabalho da Década do Envelhecimento é o Paraná, que está incentivando que os municípios façam sua adesão à Rede Global de Cidades Amigas da Pessoa Idosa. A Rede tem por objetivo integrar políticas e fazer com que o município reúna representantes de todas as suas pastas, junto com representações de conselhos de direitos, conselhos de saúde, Pastoral da Pessoa Idosa, universidades para garantir o protagonismo das pessoas idosas e saber como elas veem a sua cidade nas questões das melhorias para o envelhecimento. Quando o município adere, o Prefeito afirma que tem o interesse e a OPAS vai orientando, ajudando a formar um grupo consultor local, para que seja definido um ponto focal, para que seja feito um diagnóstico da situação

Jornal da 3ª Idade – A senhora sabe quais são as cidades do Estado de São Paulo que fazem parte da Rede Global?

Maria Cristina Hoffmann, Consultora Nacional para o Envelhecimento Saudável- OPAS/OMS, no Brasil Existem várias cidades, a mais recente é Jacareí, que tem o reconhecimento de Cidade Saudável, que é um outro programa e Cidade Amiga da Pessoa Idosa. Jacareí trabalha os dois programas de forma unificada. Isso é interessante porque vai chamando a atenção das cidades vizinhas sobre o trabalho que está sendo desenvolvido no local.

Jornal da 3ª Idade – Essa questão dos selos é muito controversa.  Tem cidades que tem o Selo Ouro de Cidade Amiga da Pessoa Idosa mas às vezes quer descumprir até as obrigações de lei. No Natal de 2020 a atual gestão da Prefeitura tentou cassar o direito das pessoas idosas de 60 anos usarem o bilhete único gratuito, 40 dias depois de publicizar que São Paulo tinha o selo máximo de Cidade Amiga da Pessoa Idosa. 

Maria Cristina Hoffmann, Consultora Nacional para o Envelhecimento Saudável- OPAS/OMS, no Brasil – Esses selos de Cidade Amiga da Pessoa Idosa não tem nada com a OMS. O programa da Organização Mundial de Saúde (OMS) não distribui selos de reconhecimento. Este programa que você cita é uma iniciativa local, certamente inspirada no programa da OMS, da mesma forma como teve em 2019 um programa federal intitulado Brasil Amigo da Pessoa Idosa

Jornal da 3ª Idade – Como fazer que todas essas propostas cheguem na ponta, diretamente nos grupos de pessoas idosas e não fiquem somente nas instituições e grupos de estudo? Estamos começando a preparar a 6ª Conferência Nacional das Pessoas Idosas, mas as demandas da base são quase as mesmas há 20 anos.

Maria Cristina Hoffmann, Consultora Nacional para o Envelhecimento Saudável- OPAS/OMS, no Brasil O desafio é enorme. O Brasil tem 5570 municípios e temos somente 50 deles com adesão. É um trabalho que necessita de muitas articulações, precisa da integração entre diferentes políticas e instituições, como o Ministério dos Direitos Humanos, da Saúde, do CONASEM, que é o Conselho dos Secretários de Saúde, da Cultura. Só assim a gente conseguirá avançar de forma rápida e melhorar a vida das pessoas idosas, para envelhecermos com qualidade e dignidade.